Xavier Martinet. "Um dos aspetos que a Dacia tem de único é perceber o essencial"

Numa altura em que a marca entra numa nova fase, a TURBO falou com o Vice-Presidente Xavier Martinet, sobre o futuro desta nova Dacia.

Numa altura em que o fabricante romeno apresenta, não apenas uma nova imagem de marca, mas, principalmente, a entrada numa nova fase da sua existência, a TURBO falou com Xavier Martinet, Vice-Presidente Sénior para o Marketing e Operações, sobre aquilo que será a nova Dacia. Uma marca que promete manter o foco no essencial, tornando-se cada vez mais atraente, até porque e conforme revelam as palavras de Martinet, a fórmula está cada vez mais apurada...

Depois de mais de uma década de crescimento sustentado e que foi também de afirmação de uma forma diferente de abordagem ao mercado automóvel, a Dacia entra agora numa nova etapa da existência, que promete trazer muita coisa de nova. A começar por esta renovação de imagem, mas também por aquele que será o próximo SUV de sete lugares, Bigster...
Xavier Martinet - O Bigster mostra exactamente aquilo que nós pretendemos fazer com esta transformação e eu acredito que vai causar impacto. Queremos que a Dacia continue a ser a Dacia, competitiva em termos de preço, embora e ao centrarmo-nos no essencial, tal não queria dizer que tenha de ser aborrecido. Queremos que seja atractivo, acreditamos que o design é bom, além de que pode ser concretizado de forma barata. Portanto, o que queremos, verdadeiramente, é ter ao mesmo tempo o preço e o design. É preciso não esquecer que, as duas grandes razões para comprar um carro, hoje em dia, na Europa, são o design e o preço. Até aqui, a maior parte das pessoas comprava um Dacia, por causa do preço. Nós queremos que as coisas continuem assim, que a Dacia continue Dacia. No entanto, também queremos acrescentar o design, ajudando a transmitir uma imagem de modernidade, de robustez...

E quanto ao Bigster, aquilo que já é conhecido, é aquilo que vamos poder ver na versão de produção?
Xavier Martinet – Quanto ao Bigster, é certo que ainda não é a versão final, mas já está bastante perto. Acho que já mostrámos que, aquilo que dizemos, fazemos. Até mesmo no caso do showcar Manifesto, nós mostrámo-lo dizendo, de imediato, que não é para passar à produção. No entanto, tem várias soluções que passarão para os próximos carros de produção: o sistema YouKip, que está no showcar e estará num modelo de produção em 2024; os materiais reciclados, que também passarão à produção em 2024; a tenda para o Jogger, que chegará em 2023. Portanto, nós queremos mostrar um design divertido e cool, com a certeza de que novas funcionalidades também chegarão.

Hoje em dia Vice-Presidente Sénior para o Marketing e Operações da Dacia, Xavier Martinet já liderou a filial portuguesa, tanto da Renault, como da Dacia

Tudo isto, com a garantia reafirmada de não descurar o preço...
Xavier Martinet – Veja-se o exemplo do Jogger, que, entre os aspectos mais importantes, está o facto de ser 300 kg mais leve do que qualquer rival de sete lugares no mercado. É certo que alguns até poderão responderão, de imediato, "Ah, mas isso não interessa nada!", mas a verdade é que são menos 300 kg de aço que é necessário pagar, também não precisamos de um motor tão potente, deixamos ainda de ter de recorrer à eletrificação... Para o cliente, torna-se muito atraente! O Spring é outro caso, são apenas 970 kg, é um carro pequeno, leve, e que, dessa forma, torna-se mais barato. Aliás, na Dacia, quando desenhamos um carro, nós fazemos questão de introduzir o preço final no caderno de encargos, não é algo que resulta da soma de todos os restantes encargos, sendo que, no final, feitas todas as somas, é um computador que acaba fixando o preço a pagar pelo cliente. Não! O preço tem de ser um input, não pode ser output...

"Com a nossa oferta, cobrimos 80% do mercado"

De resto e a par desta abordagem, digamos assim, única, a favor da Dacia, surgem igualmente notícias segundo as quais alguns competidores estão ponderar abandonar os segmentos A e B, por razões de baixa rentabilidade...
Xavier Martinet – Quanto a essas notícias, só posso dizer que, para nós, são óptimas notícias!... Nós não nos podemos esquecer das necessidades dos clientes, queremos continuar a oferecer mobilidade nesses segmentos, sendo que, até há bem pouco, tínhamos apenas o Sandero e o Duster. Entretanto, adicionámos mais dois modelos e já temos um veículo do segmento A que é 100% elétrico, até porque os centros das cidades estão a tornar-se casa vez mais elétricos. Ainda que e no nosso caso específico, não podíamos oferecer um veículo com estas características, a custar 25.000 30.000 euros... Depois e já para o segmento B, temos um hatchback, como é o caso do Sandero; em seguida, temos um familiar, que é o Jogger; depois temos ainda um bom SUV, posicionado entre os segmentos B e C, que é o Duster; e, finalmente, vamos ainda adicionar um novo SUV, também para o segmento C, que é o Bigster. E, só com esta oferta, cobrimos, sensivelmente, 80% do mercado...

Determinada a oferecer a mobilidade acessível e essencial a todos os clientes, a Dacia acredita que, só com os cinco modelos atuais, consegue cobrir 80% daquilo que é o mercado atual

Ou seja, no entender da Dacia, cinco modelos chegam e sobram...
Xavier Martinet – O que posso dizer é que vamos continuar a funcionar assim! Agora, também é verdade que temos de o fazer com produtos fortes, que não tenham de ser substituídos 3 ou 4 anos após ter sido lançados, que sejam capazes de cumprir o Euro 7, que vai entrar em vigor em 2026... Aliás e ao contrário do que alguns disseram, o GPL [Gás de Petróleo Liquefeito] vai manter-se com o Euro 7. Portanto, a Dacia está cá para ficar e, ao ver a velocidade com que os nossos clientes se vão renovando, tal só pode ser considerado uma mais-valia para nós. Se conseguirmos manter a velocidade de conquista de novos clientes e o nível de lealdade que temos vindo a registar, bom, não sou engenheiro, mas a nossa matemática parece estar a funcionar na perfeição!

Resumindo, o futuro da Dacia está assegurado...
Xavier Martinet - Trata-se de uma questão de equilíbrio. Temos de fazer dinheiro, porque, senão, desaparecemos e os nossos clientes não ficarão contentes. Depois, os concessionários também têm de fazer dinheiro, porque, senão, não exibirão os nossos carros, não estarão disponíveis para investir... E nós temos de fazer os clientes felizes. Precisamos dessas três coisas e acredito que, pelo menos até ao momento, temos feito um trabalho positivo. Mas, não nos podemos esquecer que, basta um dos três não estar satisfeito, e a fórmula não funcionará. É tudo uma questão de equilíbrio...

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Mas, então, e a ligação umbilical com a Renault?
Xavier Martinet – Sabe, eu acredito que, uma das mensagens mais importantes transmitidas por Luca de Meo, aquando da apresentação do Renaulution, em 2021, foi a de que as pessoas compram marcas e produtos, não compram companhias... Eu não oiço assim tanto clientes quanto isso a dizerem que vão comprar um carro do grupo Renault; não dizem que vão comprar um cachecol de uma companhia que fabrica artigos de luxo... Eles compram, sim, uma Marca, porque acreditam que representa algo, um determinado valor, e eles querem ter parte disso. Na verdade, não se trata de uma qualquer revolução, todas as marcas atuam assim... [...] Existem, efectivamente, sinergias dentro da própria companhia, como acontece no caso das plataformas; às vezes, até mesmo nas carroçarias, em que apenas o logótipo muda, mas isso são sinergias industriais... a Marca é a Marca. No entanto, o que verão no futuro é uma maior separação entre marcas e, inclusivamente, alguma competição entre marcas do mesmo grupo, como já vemos no grupo Stellantis ou no Grupo Volkswagen, com a utilização das mesmas plataformas, embora acopladas a diferentes tipos de carroçaria, as quais expressam, por sua vez, marcas distintas.

"Conseguir perceber o essencial é algo difícil"

Dito dessa forma, quase apetece perguntar porque é que a fórmula Dacia ainda não foi replicada...
Xavier Martinet - Sinceramente, não sei; o que sei é que não é fácil fazer uma Dacia! E não é fácil porque, aquilo que é verdadeiramente essencial na Dacia, é o coração da marca. Em toda e qualquer decisão, diga ela respeito a algo grande e importante como uma plataforma, ou algo pequeno e neste caso os exemplos são imensos, é tomada numa perspectiva daquilo que é o essencial. Nós verificamos e analisamos tudo: "É isto essencial? E aquilo, é essencial? E o outro, será mesmo essencial?". Todos os dias, temos decisões a tomar – às vezes são euros; outras, dezenas de euros; outras, ainda, milhares de euros. Mas nós tomamos todas elas segundo a perspectiva "Isto é Dacia, aquilo não é Dacia". Vale a pena citar Leonardo da Vinci, quando disse "Simplificação é o mais alto grau de sofisticação". Basta pegar num utensílio comum, de todos os dias, para ver que, quando mais simples é, melhor funciona; não é porque é fácil de fabricar ou conceber. Conseguir perceber o essencial, em todos os aspectos deste negócio – os carros, os concessionários, etc. – é algo de difícil. Sendo que, um dos aspetos que a Dacia tem de único, é esta capacidade de, em qualquer tópico, conseguir perceber o essencial.

O Dacia Spring é apontado por Martinet como um modelo que mostra a audácia da Dacia, desde logo, ao assumir-se como um EV diferente daquilo que são os princípios dominantes no mercado

Por outro lado, o facto de ser uma marca ainda pequena e ágil, também ajuda...
Xavier Martinet - É, sem dúvida, importante conseguir ser ágil, mas também ser capaz de tomar decisões audazes. Às vezes, é preciso coragem para ir contra aquilo que são as práticas já instaurada no mercado... Por exemplo, fazer um elétrico como o Spring, com apenas 125 km/h de velocidade máxima, foi uma decisão audaz, mas nós fizemo-lo, porque os clientes neste segmento não precisam, por exemplo, de andar no IC19 a 160 km/h... [risos]. E se formos até Almada, pela 25 de Abril, não podemos circular além de 70 km/h... Portanto, também na mobilidade urbana, na mobilidade elétrica, temos de fazer escolhas e nós continuamos a fazer exactamente isso em que cada carro que lançamos... E quanto mais fizemos as coisas assim, melhor!