A Porsche tem um dos seus principais centros de testes na Lapónia e foi lá que conduzi o Taycan 4S. Primeiro em estradas desertas e geladas e, depois, em pista… neste caso para avaliar as capacidades para a prática do "freestyle"
São quase 11 horas da manhã e ainda vão demorar mais 20 minutos até que o sol suba acima da linha do horizonte onde vai permanecer durante não mais que duas horas. Aqui, na Lapónia, a cerca de uma centena de quilómetros do círculo polar Ártico, as estradas estão totalmente cobertas de gelo e neve. E desertas – só ao fim de 75 km me cruzo com o primeiro carro.
Elegância
Não é o local ideal para ensaiar um Porsche mas serve para ressaltar algumas das qualidades do Taycan 4S. A começar pelo silêncio com que desliza pela estrada desenhada entre a floresta onde só aqui e ali surgem algumas casas.
Para se fazer anunciar e cumprir com as normas europeias de segurança, o Taycan 4S está equipado com um sistema que simula o som do motor, o qual está ativo acima dos 20 km/h. Em opção, é possível adquirir um outro sistema que simula o som habitual dos motores de seis cilindros da Porsche, o qual é ativado quando escolhemos o modo de condução Sport Plus.
Nos modos de condução "gentleman driver" ressalta a forma segura como pisa a estrada que alterna entre a neve fofa, devido à absoluta ausência de trânsito, e o gelo inevitável dada a quase total ausência do sol.
Os pneus 285/40, na traseira e 245/45, na frente, montados em jantes de 20 polegadas (19 polegadas de série) são a antítese daquilo que a condução nestas circunstâncias recomenda mas apesar da enorme superfície de contacto tudo acontece sem sobressaltos, desde que o acelerador não seja desafiado com alterações de carga bruscas e que o volante seja manejado com doçura.
O modo de condução Normal é o mais aconselhado, à prova de qualquer surpresa, fazendo sobressair a forma suave como o Taycan percorre uma superfície que está longe de primar pela regularidade.
Estão também disponíveis os modos Range (gestão mais eficiente da energia elétrica que limita a velocidade entre os 90 km/h e os 140 km/h e que reduz a altura ao solo em 22 milímetros, para melhorar a aerodinâmica), Sport, que torna a resposta ao acelerador mais imediata, ao mesmo tempo que reforça a firmeza da suspensão, e Sport Plus que se caracteriza pela resposta pronta que esperamos de um desportivo, atuando sobre a cartografia do motor, bem como sobre a aerodinâmica, mantendo o chassis na posição mais baixa, ao mesmo tempo que a "asa" traseira oferece a máxima sustentação.
Lembro-me de repente que estou ao volante de um Porsche e do que isso significa mas o estado da estrada e o anúncio de que daqui a pouco, vou ter à disposição toda uma Eurodisney para adultos (a pista onde a Porsche desafia os seus clientes a avaliar as capacidades dos seus carros) traz-me o bom-senso de volta .
Autonomia em destaque
Aproveito para uma primeira avaliação àquela que é uma das preocupações principais dos clientes de carros elétricos. Para a versão mais acessível (110 mil euros) do Taycan, a Porsche prevê duas variantes que têm em conta a capacidade da bateria e a potência do motor .
Para este "holiday on ice" na Lapónia entregam-me um Taycan 4 S, na versão Performance Battery Plus (571 cv em overboost e autonomia máxima anunciada de 463 km), com a bateria de 93,4 kWh carregada a 90%.
Ao fim de 147 km, utilizando maioritariamente o modo de condução que maximiza a regeneração de energia, o computador de bordo indicava que a bateria mantinha 52% da carga. Ou seja, naquelas circunstâncias – trajeto totalmente plano, percorrido a uma velocidade média de 65 km/h, com um consumo médio verificado no computador de bordo (24,7 kWh) inferior ao anunciado - caso a bateria estivesse carregada a 100%, teria sido possível cumprir quase 520 km.
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Um valor que é melhor do que o máximo anunciado oficialmente (463 km). É verdade que rolámos a uma velocidade para a qual ninguém precisa de um Porsche… mas fica bem evidente aquele que é um dos grandes atributos do Taycan: a grande capacidade de regeneração de energia, possibilitada pela utilização (inédita) da tecnologia de 800 volts.
Quase sem travar
De acordo com a Porsche, quando acionamos a função de máxima capacidade de regeneração é possível que o pedal de travão apenas seja utilizado em 5% das situações; nas demais basta aliviar o pé do acelerador.
Em cidade ou em estrada de montanha, facilmente tiramos pleno partido desta função que, além de permitir o aproveitamento da energia que de outra forma seria desperdiçada, explica que a Porsche anuncie uma duração de seis anos para as pastilhas de travão.
Sosseguem aqueles que não apreciam a sensação de que o carro vai travar cedo demais; isso não acontece, pois ao retirarmos o pé do acelerador o carro limita-se a entrar em modo "coast" (deslizando o máximo possível, enquanto os motores passam a funcionar como gerador de energia que é armazenada na bateria.
Ainda a propósito da unidade motriz, que comporta os dois motores elétricos, um na frente e outro na traseira, neste caso mais pequeno do que está nas versões Turbo e Turbo S, além da caixa de duas velocidades na traseira, uma das características mais importantes tem a ver com a velocidade de carga da alojada no piso, para assegurar a melhor distribuição do peso, essencial num desportivo e característica principal de qualquer Porsche.
Os engenheiros alemães garantem-nos que esta manteve-se como uma das preocupações centrais do projeto Taycan. Se o objetivo foi alcançado… é uma avaliação que deixaremos para mais parte, já que o estado completamente gelado da pista serviu, tão só, para testemunhar que o comportamento, face a qualquer outro modelo da Porsche com tração integral, manteve-se quase inalterado.
Neste caso, a potência é maioritariamente canalizada pelo motor traseiro para as rodas posteriores, para em seguida, se aliviarmos um pouco o pé do acelerador o motor dianteiro fornecer alguma "vida" ao trem anterior, para repor o equilíbrio.
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Inalterada mantém-se, também, a forma de controlar longas derrapagens em "drift" que o Porsche Taycan 4S cumpre com aquela "graciosidade" apenas ao dispor de automóveis com doses massivas de potência. Neste caso, basta manter a carga certa (constante) sobre o acelerador e não exagerar na contrabrecagem, para que no final, quase por magia, a trajetória certa seja retomada.
Tecnológico
O sol, de cujo único sinal tinha sido um ligeiro avermelhar da linha do horizonte entre as 11.30h e as 13:30, já tinha feito as despedidas mas a diversão prosseguia mesmo que os pneus de inverno (sem pregos) não conseguissem fazer milagres em cima da superfície que, entretanto, após repetidas passagens, se tinha transformado numa espécie de placa de vidro, com aderência nula.
Pressionar a fundo o acelerador, com a função "Launch Control" ativa para tentar perceber da veracidade dos números reclamados (0-110 km/h em 4.0 segundos) era um exercício quase patético: o Taycan 4S simplesmente não saia do mesmo sítio, até porque todas as ajudas ativas estavam em "off".
Resta aproveitar o aconchego de um interior concebido para quatro ocupantes onde depressa percebo que estou em plena era da digitalização.
Além de todas as funções de segurança e entretenimento a principal novidade prende-se com a possibilidade de, em opção, o acompanhante poder dispor, mesmo à sua frente, de um terceiro ecrã digital que pode ser parametrizado de forma totalmente independente: ali podem surgir as informações do GPS, do sistema de som, ou da viagem, permitindo-lhe, por exemplo estar a par da autonomia ou da eficiência energética.
Confortável, graças a um chassis muito bem afinado que conta com a suspensão pneumática (três câmaras) e em opção barras estabilizadoras activas, e com bastante espaço na traseira, o Taycan 4S mantém, ainda assim, intacta a genética desportiva evidente na posição de condução ou na disposição de toda a instrumentação Digital) orientada para o condutor.
A total ausência de botões, substituídos pela função "touch" nos diferentes "displays"ou no volante multifunções, prossegue o trabalho realizado nos últimos modelos da marca alemã. O resultado é um interior ao mesmo tempo Hi-Tech e pleno de charme.
Dois atributos que caracterizam o Taycan 4 S cujas primeiras unidades começam a chegar a Portugal.