O futuro incerto do coupé alemão, não impede a realização de um face a face: Alpine A110 vs Audi TT. Dois automóveis únicos juntos num momento para mais tarde recordar.
Ainda sem sucessão prevista, a atual geração do Audi TT corre o risco de ser a última do pequeno coupé alemão. Já o Alpine A110 veio para ficar.
Pelo menos era essa a ideia, antes da incerteza dos tempos que vivemos ter colocado o futuro em suspenso. Importa, portanto, aproveitar a oportunidade para criar um cenário Alpine A110 vs Audi TT. Um comparativo improvável entre dois coupés desportivos que correm o sério risco de se transformarem em edições de colecionador.
Encontrar as diferenças entre o Audi TT apresentado em 2014 e o atual é relativamente fácil. Estão na grelha. As barras horizontais deram lugar a um padrão entrançado, que se prolonga para as entradas de ar inferiores, também elas com um desenho mais dinâmico.
As restantes novidades, para além do abandono do motor diesel e da adoção filtros de partículas para os blocos a gasolina, passam pelo reforço do equipamento de série.
Por mero acaso partilhámos a ilha de um posto de abastecimento com um Audi TT da primeira geração. Tem apenas menos 15 cm de comprimento, mas parece muito mais pequeno. Um brinquedo de formas arredondadas, interrompidas apenas pelo spoiler traseiro. Um deselegante acrescento ao desenho original, necessário para garantir a estabilidade durante mudanças de direção rápidas executadas a velocidades elevadas.
Choque de gerações
Admirar as duas versões lado a lado, acentua o choque de gerações. A pureza das linhas originais perdeu-se em favor da eficácia, com as arestas e os ângulos a substituírem o suave ondular da primeira geração.
Só nos resta esperar que daqui a alguns anos, num futuro trabalho Alpine A110 vs Audi TT, não estejamos a escrever o mesmo sobre o Alpine A110. Ao contrário do Audi TT, o Alpine A110 parece ter a continuidade garantida.
Depois de conduzir um Premiere Edition do parque de imprensa internacional da Alpine (unidade 17/50), tivemos oportunidade de conhecer uma das primeiras unidades de produção "normal". Um A110 Légende, que se diferencia da versão ensaiada em 2018 pela funcionalidade.
Não costuma ser um traço distintivo de coupés desportivos, mas no caso do Alpine faz todo o sentido.
O primeiro A110 que conduzimos não tinha um local seguro para transportar a carteira e o telemóvel. Há um espaço sob a consola central, mas ficou provado que o telemóvel sai disparado depois de uma travagem mais forte.
Garrafas de água? Boa sorte! Este A110 Légende resolve estes problemas com uma bolsa entre os bancos. Engole uma garrafa de água de litro e meio e ainda sobra espaço para carteiras e outros pequenos objetos.
A regulação da inclinação das costas do banco é outra novidade bem-vinda.
Mais funcionalidade
Apesar de não ter onde os transportar com segurança, o A110 sempre teve ligação por cabo para smartphones e respetiva função de espelho. Controla-se tudo pelo ecrã flutuante ao centro do tablier, cuja apresentação lógica e ordenada esconde alguns ícones pequenos e difíceis de apontar durante a condução.
O painel de instrumentos digital tem grafismos distintos para os modos de condução normal e desportiva, acionada por um botão específico no volante, que se diluem para mostrar a imagem da câmara traseira.
Esta aparece sempre que se pressiona o botão da marcha atrás na consola central. Uma boa solução até os braços do volante obstruírem a imagem.
Sem seletor mecânico, a caixa de sete velocidades e dupla embraiagem controla-se por intermédio de três botões: D, N e R. Patilhas fixas na coluna de direção permitem uma maior interação com o motor, mas são curtas, especialmente na zona inferior, que fica rapidamente fora do alcance das pontas dos dedos.
Pequenos apontamentos que acabam por reforçar o caráter de um coupé desportivo com uma posição de condução, de outra forma, irrepreensível.
Mesmo confortável
Se há coisas que é preciso experimentar para acreditar neste confronto Alpine A110 vs Audi TT, o conforto do Alpine é uma delas.
Com 94% dos componentes do chassis e carroçaria em alumínio, o A110 pesa menos de 1200 kg. Leve, baixo e com o centro de gravidade a 400 mm do solo, entre os dois bancos, sensivelmente na zona onde termina o forro em pele da consola central, o Alpine não precisa de amortecedores demasiado firmes. Permite mesmo um suave ondular nas mudanças de apoio, que convida a explorar as transferências de massas e toda a amplitude de movimentos permitidos pelo chassis antes de acordar a "polícia" eletrónica.
Duas décadas de evolução e mais alguns quilos permitem ao Audi TT oferecer outro tipo de mordomias. O interior é mais espaçoso e os bancos mais convidativos.
Mas só à frente. Os dois pequenos lugares traseiros devem ser encarados como extensão dos 305 litros da mala, opção para a qual estão preparados com um sistema fácil de rebatimento das costas.
Um conjunto de espaços de arrumação distribuído pela consola central e bolsas das portas contribui para uma utilização quotidiana mais funcional.
Num saudável gesto de rebelião contra os ecrãs táteis da moda, o Audi TT dispensa o tablet do tablier. Concentra a informação no painel de instrumentos virtual, estreitando a ligação entre condutor e máquina.
Se o passageiro quiser mudar o destino da navegação ou controlar a playlist do smartphone integrado com o TT vai ter de se contentar com os gráficos do aparelho…
Verdadeiramente divertido
Descodificando a nova nomenclatura da Audi, as imagens mostram um TT 2.0 TFSI de 245 cv, com caixa de dupla embraiagem S tronic de sete velocidades e tração integral quattro. Uma combinação conhecida, de eficácia comprovada, com um "twist": este TT é verdadeiramente divertido. É um quattro que eleva a condução a um patamar acima da pura segurança e neutralidade dos sistemas de tração integral.
Um retrato perfeito… se não tivesse um A110 no mesmo enquadramento. O fator novidade do Alpine tende a ofuscar a vizinhança e, mesmo não sendo um concorrente direto, a agilidade e ligeireza do coupé francês superam a eficácia do alemão.
Com o motor 1.8 Turbo montado em posição transversal atrás do habitáculo, o Alpine concentra a massa entre os eixos, favorecendo ligeiramente o posterior na distribuição de peso 44:56.
Sem o lastro do bloco de quatro cilindros a atrapalhar, a capacidade do eixo dianteiro para manter trajetórias é fenomenal. Segura a linha com uma saudável obstinação, transmitida sem filtros ao volante.
A intensidade da comunicação varia em função dos modos de condução Normal, Sport e Track. Os três níveis de intensidade são extensíveis à gestão do motor e da caixa.
Motor central traseiro
Com o motor a respirar nas nossas costas, somos brindados com a tradicional banda sonora composta por roncos, explosões e estalidos. Um vício que convida a abusar das reduções e do modo manual da caixa. Esta surpreende pela rapidez e fiabilidade da resposta, nada ficando a dever a transmissões mais sofisticadas e caras.
Os 4,5 segundos do arranque até aos 100 km/h são um bom indicador da excelente interação entre caixa e motor, mas o Alpine A110 não é um especialista em velocidade pura. É mais subtil. Convida a explorar um chassis que nunca chega a ser verdadeiramente desafiado pelo motor.
Mais pesado e com menos sete cavalos, ainda que com binário superior disponível mais cedo, o Audi precisa de 5,2 segundos para arrancar até aos 100 km/h.
Sendo rápida, a caixa S tronic não atinge o nível de interação da transmissão do Alpine.
A direção segue o mesmo caminho, precisando de mais assistência para disfarçar o peso do motor sobre o eixo dianteiro.
Aceleração lateral
No entanto, a velocidade de passagem em curva mantém-se muito elevada. Nem é preciso olhar para o velocímetro ou para o cronómetro, basta sentir a intensidade com que as costelas são esmagadas contra os apoios laterais dos bancos.
É a eterna disputa entre talento natural e trabalho árduo. Messi e Ronaldo. Alpine A110 vs Audi TT.
Mas não vamos entrar em comparações. Não seria justo. Alpine A110 e Audi TT movem-se em universos que se cruzam, sem sobreposição ou concorrência.
Unidos pela potência e conceito, distinguem-se pela forma como atingem o mesmo resultado. Alpine com graciosidade, Audi com muita técnica e empenho. O resto é mesmo uma questão de gosto pessoal.
Exclusividade para dois no A110, com a certeza de não passar despercebido, ou tranquilidade para dois mais filhos pequenos no TT, com a garantia de segurança da tração integral.
Comparativo publicado na íntegra na Turbo 455